Projeto de Pesquisa CNPQ estuda Ela não é mulher pra casar de Vanessa Teodoro Trajano
Gente, é com muita alegria que compartilho com vocês a entrevista que a Mayra Raquel de Oliveira Silva, do 4º bloco de Letras Português da Universidade Estadual do Piauí, fez comigo recentemente. Ela está desenvolvendo uma pesquisa CNPQ com a orientação da maravilhosa professoa Ms. Joselita Izabel, cujo título do trabalho é "A escrita erótica através de Ela não é mulher pra casar de Vanessa Trajano". Eu gostei muito do resultado e por isso compartilho aqui com vocês. Gratidão pela entrevista e pelo trabalho, desejo boa sorte e sucesso a ambas!
Para você ainda existe preconceito com mulheres escritoras?
Não diria preconceito, pois não precisamos mais nos esconder atrás de um pseudônimo masculino para chegar ao mercado editorial, mas há certa preferência em premiar homens, principalmente se forem brancos e estiverem inseridos no eixo Rio-São Paulo. Não consigo identificar um visível impedimento para que as mulheres escrevam e até publiquem, porém os grandes prêmios ainda estão sendo destinados para eles em sua maioria. É claro que essa “tendência” pode ser considerada uma forma de preconceito. É como se dissessem: elas podem até escrever e publicar, mas não permitiremos que se transformem em cânones nem lhe daremos cadeiras na Academia.
Quando foi o momento que você se reconheceu como escritora?
Na primeira infância eu desenhava e arriscava uns versos. Meus professores sempre diziam: é uma artista. Mas ninguém de fato incentivou, pois se tratava de um hobby e pobre não tem que ter ânsia de rico, já que esse negócio de passar o dia criando era para quem não tinha que se preocupar com o futuro. Em parte tinham razão, não acuso os meus professores de nada. Adormeci um pouco durante alguns anos, mas na adolescência a pulsão de criar voltou como uma necessidade, como uma boia no meio do oceano depois de ter passado muito tempo submersa. E aí criei um blog, entrei no teatro e me fiz, de lá pra cá.
Como você descreve seu processo de produção literária?
Eu nunca sei responder essa pergunta porque não se trata de um único processo, cada livro nasce de uma forma diferente e vou me redescobrindo a cada nova obra. Porém, atualmente, gosto de escrever a mão. Depois de muito tempo digito e leio e releio algumas vezes. Depois deixo o texto hibernando. Um ano, dois. Depois volto a ler e reler, ajeitando, suprimindo, acrescentando. Depois hiberno de novo. E por aí vai, até eu considerar que não há nada mais a ser mudado.
Como ocorre as escolhas dos títulos de seus livros?
Mulheres Incomuns foi resultado do meu blog (conviteparalervanessatrajano) que a propósito abandonei e troquei por trajanote.blogspot.com. Eu olhei para todos aqueles contos cujas protagonistas eram todas mulheres e disse: nossa, essas mulheres são tão incomuns! Daí vi que era um bom título. Poemas Proibidos me veio depois de repensar a respeito da interditação na literatura erótica. Doralice é simplesmente o nome da protagonista, mas gosto de pensar na coisa de Dor de
Alice. Não sei se o leitor consegue ver o mesmo. E, por último, Ela não é mulher pra casar veio de algo que acho que toda mulher incomum já escutou. Um cara qualquer chega numa mulher empoderada e sempre vai achar que ela não é mulher pra casar. Mas gostaria que essas mulheres não vissem dessa forma, mas sim que ela não é mulher pra casar… com aquele cara.
Quais motivos te levaram a escrever a literatura erótica?
O sexo para a mulher ainda é um tabu, né? Sou e sempre fui revoltada com isso. Quando eu era criança, eu queria brincar com o meu irmão e os amigos dele e minha mãe nunca deixava. Eu perguntava: por que não? Porque você é mulher. Pronto, bela resposta, explica muita coisa. Anos mais tarde, via que os meninos na escola eram garanhões, pois ficavam com várias meninas e saíam moralmente intactos disso. Se alguma moça ousasse se comportar como eles só ouvia os burburinhos. Puta era o nome mais bonito que saía. Quanta injustiça, meu Deus. Então, comecei não só a escrever sobre esse assunto como também agir que nem homem – a minha bandeira em prol da liberdade sexual não se fazia somente na escrita, mas na minha própria vivência. Eu jamais poderia permitir me castrarem enquanto eles estavam sempre impunes. Literalmente. Hoje o feminicídio nos assusta, mas não devemos nos calar. Creio que a sociedade patriarcal ainda não está preparada para essa nova mullher que se enuncia, que sacia o seu prazer e que também aprendeu a dizer NÃO. É por esse motivo que continuarei escrevendo sobre o erotismo, porque a mulher que é dona do próprio corpo é igualmente dona do próprio destino, e por esse motivo não serão eles que continuarão a dizer se devemos morrer ou viver. Somos nós. O erotismo feminino é um assunto urgente porque representa um dos últimos degraus para a nossa total libertação. Eles que se acostumem.
Quais dificuldades você enfrenta por ser uma escritora de literatura erótica?
Assédio, calúnia, difamação… Tá bom pra você? Rs. Mas quando isso vem da macharada nem me incomoda. Não que não me incomode, mas não dá pra esperar outra coisa de homens que são extremamente machistas quando veem uma mulher jovem e bonita com uma obra de literatura erótica, eles no mínimo acham que sou prostituta. Eu meio que não me importo quando vem deles. Mas quando vem de outras mulheres, inclusive de feministas, aí sim, eu fico bem triste. Portanto, ao você me perguntar quais são as dificuldades nessa minha saga, penso que o pior é a falta de apoio de outras mulheres.
O que você espera alcançar de seu público com seus livros?
Eu quero que uma mulher termine de ler o livro e saia para beijar na boca aquela amiga que nunca teve coragem de beijar, que vá a um bar e se permita seduzir e ser seduzida se isso alguma vez já foi um problema por traumas do passado, que possa se soltar mais na cama ou que as fantasias sexuais não sejam mais vistas como aberrações, mas sim manifestação dos nossos desejos mais ocultos; que ela consiga expressar seus anseios e seus sonhos e que reconheça no amor bem mais que a obrigação de um final feliz; que ela esteja presente de fato em todas as suas decisões e expulse delas todas as vozes repressoras que infestam seus pensamentos; que ela seja, enfim, o grande amor da vida dela. É isso que eu quero.
E os homens, bem, ver se eles podem aprender um pouquinho com a gente, né? Porque tá difícil, santa paciência.


É um imenso prazer para mim trabalhar com uma obra tão impactante, impactante e envolvendo.
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